4.9.07

consagração da primavera



vamos lá...o semestre já está desbotando, a primavera continua no ar de São Paulo (todos os dias entre 08:00 e 11:00), aviões caem, serviços de saúde subitamente se convertem em "melhores do mundo" e a gente tem que continuar...alguma coisa. Não sei porque me é cada vez mais recorrente a imagem daquele velho desenho do pica-pau, onde um bando de lunáticos desciam o Niagara Falls em barris, enquanto lunáticos entorpecidos de capas de chuva amarelas simplesmente observavam e aceitavam aquilo como parte da vida.

e talvez seja.

todos queremos fazer algo proibido, dar vazão à criança interior ("sliiiiiiide!"). no entanto, animais sociais que somos, nos controlamos para facilitar o convívio com o(s) próximo(s). se levarmos isso às últimas consequências, temos que os fortes se aproveitam dos fracos, os lobos das ovelhas, nobres impunham impostos e taxações exorbitantes aos seus súditos e eles, claro, pagavam, com medo de incorrerem na ira do filho do céu. não é muito diferente do que vivemos hoje, não? obviamente, não espero que nos tornemos todos lobos, a legislação proíbe o monopólio de mercado. mas, sinceramente, seria pedir demais que aprendêssemos um pouco mais com os exemplos passados?

vejamos...que tal ghandi? desobediência civil é uma idéia muito boa, imagino o que aconteceria se, do dia para a noite, uma parte considerável e substancial da cidade - digamos a zona oeste - se negasse a pagar impostos municipais sob o argumento de que eles não estão sendo devidamente revertidos em benefícios, ou seja, impostos para o trânsito e as vias de transporte não revertem em melhores ruas, avenidas e sistemas de transporte público; impostos de saúde não revertem em melhores hospitais, clínicas e pronto-socorros e médicos e enfermeiros; impostos para educação não revertem em melhores escolas e professores etc. me parece que seria uma boa maneira de pressionar o governo, seja ele de instância municipal, estadual ou federal.

o espertinho da cadeira do fundo pergunta: "mas e nós, como ficamos sem esses serviços?". Eu respondo com outra pergunta: nós temos, efetivamente, esses serviços? estamos sendo bem atendidos pelo governo? então, que é que temos a perder?



é normal ouvir as pessoas mais velhas falando adolescente acha que o mundo nasceu com ele... e se pararmos para pensar, não é verdade? ora, é na adolescência que começamos a realmente nos dar conta da alteridade, de que os outros não estão lá para nos servir ou como uma manifestação levemente descontrolada do nosso subconsciente/inconsciente, que eles também são pessoas que independem da nossa vontade, e estarão lá quando fecharmos os olhos (seja esse onde for). assim, quando, nessa época da vida, achamos que tal banda foi a primeira a fazer x coisa no palco e vem aquele coroa dizer "olha, não é bem assim, jimi hendrix já fez isso lá nos anos '60...", é normal que a molecada diga tá falando merda!. por quê? porque jimi hendrix não existe na cabeça deles; o show da banda x existe como uma realidade atual, que se pode ouvir/ver/comprovar...como fazê-lo com os anos 60?

dando um passo a mais: os fatos alegados podem ser comprovados, mas como entendê-los sem ter estado lá? de certa maneira, o que a banda x faz (nesse exemplo extremamente pedagógico e simplificado) é atualizar esses dados para a atualidade. chamemos a isso de reinserção histórica. então, por quê tantos problemas entre a molecada e os que vieram antes? porque, atualmente, a informação que chega aos novos é superficial, enciclopédica, e as pontes entre o que já foi e o que é cedem e caem sobre o rio. consequentemente, o que era uma revisão passa a ser a história sendo feita, aqui e agora, sem precedentes. em suma, passa a ser uma visão histórica, ao invés de uma revisão. assim, temos uma juventude com um acesso à informação sem precedentes na história humana, mas que não sabe o que procurar, como estabelecer relações, extrapolar conclusões, pensar. e temos diversas gerações anteriores que não tem tanta intimidade com o ferramentário mas que pensa. resultado: conflito generacional. em última análise, o fato que o guri presencia (ainda que de maneira não presencial) já não é o mesmo que àquele presenciado por seus pais décadas atrás. quando alguém queima uma guitarra hoje, não está invocando um espírito totêmico como hendrix e, por consequência, não está fazendo o mesmo que antes, ainda que o gesto seja idêntico.



a propósito, quem diz que o heavy metal é coisa dos anos '70 nunca ouviu "Le sacre du printemps".