27.4.07

cursum perficio

Verbum sapienti:

quo plus habent,

eo plus cupiunt.

Post nubila,

Phoebus

Iterum.


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pensava deixar essa postagem para o final do ano, quando já estivesse garantida minha ida para outras terras. No entanto, quanto mais tempo passa, mais me dou conta de que já naquele momento me despedia. Assim - ainda que atrasado - fica o registro daquele momento, poético talvez só para mim, do parto metafórico de um sentimento vivo.

as coisas vivas erram.

nada podre da errado.

em verdade, em verdade vos digo,

estou cansado. muito cansado. (i)mor(t)almente cansado.

cansado de falar do desperdício, da hipocrisia (no nosso caso, suponho que o prefixo venha de hipos – cavalo – e não de hypo – pouco), do cavalo-caso cool dos pseudo-intelectuais dos diversos "centros de estudos de trocadilhos" (também conhecidos como faculdades), da corrupção generalizada, do roubo institucionalizado, do desfiar de lamentações pelo "po-bre-zi-nho-do-po-vo-bra-si-lei-ro" (ainda me pergunto quem é esse tal de "povo brasileiro" de que tanto falam), da dor de cotovelo alheia, da ignorância, do nosso politeísmo mal assumido (chega a ser ridículo, um país que não pode dedicar um feriado a seu primeiro santo canonizado pela madre igreja de roma porque excedeu a quantidade de feriados no ano), do...


still talking to myself, and nobody's home...


às vezes vejo passarem pessoas, reconheço algumas, outras nem tento. me sinto como "o inominável", não posso mover nem mesmo os olhos para conferir se tenho um corpo, se tenho membros; há luzes aqui, suponho que de diversos matizes e cores e intensidades ainda que todos esses matizes e cores e intensidades se percam na bruma-ambiente e se pareçam cinza, não, não cinza, mas um sépia envelhecido, quase bege. os sons morrem perto, não há eco, nenhuma vibração reverbera em meu presumido corpo, pois que creio que as reverberações que sinto sejam provenientes de mim mesmo (será possível um corpo produzir e reverberar simultâneamente, me pergunto, creio que sim). não há tato, tudo – se assumimos que tudo é aquilo que importa para alguém, como um signo é algo que representa algo para alguém – dizia, tudo está longe demais para causar a menor sensação tátil em mim, se é que há uma massa biológica para senti-la. não posso dizer que sinta cheiro, assim como não posso dizer que sinto algum sabor, pois que conheço apenas um cheiro e um gosto (se o são) e não tenho bases de comparação para afirmar tal coisa. creio poder afirmar que penso, ou que penso que penso, talvez tudo não passe de uma elocubração na cabeça de alguém e eu seja simplesmente uma ficção, não, não, isso já seria ir longe demais, estaria eu me convertendo num paranóico, me pergunto, mas logo desfaço tal suposição, pois que não sei o que e um paranóico, nunca vi um nem conversei com um para saber ou ter a mínima idéia do que é ser paranóico. ao fim, percebo estar andando, não, não poderia estar andando por que não sinto minhas pernas (se as tenho) se mexendo, assim que percebo estar pensando em círculos. talvez agora seja melhor eu começar por outro lugar, se existir outro lugar, onde agora, me pergunto, quando agora, me pergunto, quem agora, me pergunto.


so nobody ever told you baby, how it was gonna be?


me deixo consumir pelo stress, fumando demais e comendo mal, partindo da hipótese de que uma hora me cansarei disso (como uma criança que come doce demais e depois enjoa) e tocarei minha vida pra frente livre dessas amarras. mas e não é que, bem em meio a essa crise tão dramática e pungente, no momento em que deveria levar a platéia às lágrimas, me dá uma vontade louca de comer suspiro?

24.4.07

lean mean fat grilling machine

Acreditem, não é picaretagem. Simplesmente recolocando em público certas coisas já ditas que valem a pena. É curioso notar quanta gente anda por aí com os referenciais meio distorcidos (na minha opinião, claro) e como essa letra continua atual. Àqueles a quem a carapuça serve, sintam-se em casa.

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Locomotive (complicity)

Gonna find a way to cure this loneliness
Yeah I'll find a way to cure the pain
If I said that you're my friend
And our love would never end
How long before I had your trust again
I opened up the doors when it was cold outside
Hopin' that you'd find your own way in
But how can I protect you
Or try not to neglect you
When you won't take the love I have to give
I bought me an illusion
An I put it on the wall
I let it fill my head with dreams
And I had to have them all
But oh the taste is never so sweet
As what you'd believe it is-
Well I guess it never is
It's these prejudiced illusions
That pump the blood
To the heart of the biz

You know I never thought
That it could take so long
You know I never knew how to be strong
Yeah, I let you shape me
But I feel as though you raped me
'Cause you climbed inside my world
And in my songs
So now I've closed the door
To keep the cold outside
Seems somehow I've found the will to live
But how can I forget you
Or try not to reject you
When we both know it takes time to forgive

Sweetness is a virtue
And you lost your virtue long ago
You know I'd like to hurt you
But my conscience always tells me no
You could sell your body on the street
To anyone whom you might meet
Who'd love to try and get inside
And bust your innocence open wide

'Cause my baby's got a locomotive
My baby's gone off the track
My baby's got a locomotive
Got ta peel the bitch off my back
I know it looks like I'm insane
Take a closer look I'm not to blame
No

Gonna have some fun with my frustration
Gonna watch the big screen in my head
I'd rather take a detour
'Cause this road ain't gettin' clearer
Your train of thought has cut me off again
Better tame that boy 'cause he's a wild one
Better tame that boy for he's a man
Sweetheart don't make me laugh
You's gettin' too big for your pants
And I's think maybe you should
Cut out while you can
You can use you illusion-
Let it take you where it may
We live and learn
And then sometimes it's best to walk away
Me I'm just here hangin' on
It's my only place to stay at least
For now anyway
I've worked too hard for my illusions
Just to throw them all away

I'm taking time for quiet consolation
In passing by this love that's passed away
I know it's never easy-
So why should you believe me
When I've always got so many things to say
Calling off the dogs a simple choice is made
'Cause playful hearts
Can sometimes be enraged
You know I tried to wake you-
I mean how long could it take you
To open up your eyes and turn the page

Kindness is a treasure-
And it's one towards me you've seldom shown
So I'll say it for good measure
To all the ones like you I've known
Ya know I'd like to shave your head
And all my friends could
paint it red
'Cause love to me's a two way street
An all I really want is peace

But my baby's got a locomotive
My baby's gone off the track
My baby's got a locomotive
Got ta peel the bitch off my back
I know it looks like I'm insane
Take a closer look I'm not to blame
No

Affection is a blessing
Can you find it in your sordid heart
I tried to keep this thing
ta-gether
But the tremor tore my pad apart
Yeah I know it's hard to face
When all we've worked for's gone to waste
But you're such a stupid woman
And I'm such a stupid man
But love like time's got its own plans

'Cause my baby's got a locomotive
My baby's gone off the track
My baby's got a locomotive
Got ta peel the bitch off my back
I know it looks like I'm insane
Take a closer look I'm not to blame
Yeah
If love is blind I guess
I'll buy myself a cane

LOVE'S SO STRANGE

23.4.07

the fountain

Fazia frio, eu não tinha a menor vontade de me levantar. Estiquei o braço para uma prateleira e peguei um livro que trouxera e do qual gostava muito: os poemas de Mallarmé. Li lentamente, ao acaso; fechei-o, tornei a abri-lo, deixei-o de lado. Nesse dia, pela primeira vez, tudo isso me pareceu sem sangue, sem odor nem sabor, sem substância humana. Pelavras de um azul-desbotado, vazias, soltas no ar. Uma ´gua destilada, perfeitamente pura, sem micróbios, mas também sem conteúdo nutritivo. Sem vida.
Como nas religiões que perderam sua inspiração criadora os deuses se tornaram apenas motivos poéticos ou ornamentos decorativos da solidão humana – e das paredes –, assim era esta poesia. A aspiração veemente do coração cheio de terra e de sementes transformou-se num impecável jogo intelectual, uma arquitetura aérea, erudita e complicada.
Tornei a abrir o livro e recomecei a leitura. Por que esses poemas me empolgaram durante tantos anos? Pura poesia! A vida transformada em jogo lúcido, transparente, nem sequer pesada como uma gota de sangue. O elemento humano é carregado de desejo, é turvo e impuro – amor, carne, lamento. Que se sublime, pois, a idéia abstrata e, no alto-forno do espírito, de alquimia em alquimia, se imaterialize e se dissipe!
Como todas aquelas coisas, que outrora tanto me fascinaram, naquela manhã pareciam apenas acrobacias charlatanescas! Sempre, no declínio de todas as civilizações, é assim que se acaba a angústia do homem, como nos jogos de prestidigitador, cheios de maestria – poesia pura, música pura, pensamento puro. O último homem que se libertou de qualquer crença ou ilusão, que nada mais espera e em nada mais crê – vê a argila de que é feito reduzida a espírito; e o espírito não tem mais onde lançar suas raízes para sugar e se nutrir. O último homem esvaziou-se; nem sementes, nem excrementos, nem sangue. Todas as coisas se tornaram palavras; todas as palavras, artifícios musicais. O último homem vai ainda mais longe: senta-se no topo de sua solidão e decopõe a música em mudas equações matemáticas.
Tive um sobresalto e exclamei para mim mesmo: "Buda é o último homem! Eis aí o seu sentido secreto e terrível. Buda é a alma pura que se esvaziou; nele está o Nada, ele é o Nada. 'Esvaziai vossas entranhas, esvaziai vosso espírito, esvaziai vosso coração!', grita ele. Onde pisar, não brota mais água, não cresce erva, não nasce uma só criança. É preciso", pensei, "citá-lo, mobilizando as palavras encantadas, apelando para a cadência mágica, e lançar-lhe um feitiço que o faça cair de minhas entranhas! É preciso que, para me livrar, eu o prenda na rede das imagens!"

(Nikos Kazantzakis, Zorba, o Grego)



If I started from the top
And worked my way down
There'd be no reason
To live forever

The starvation has turned
Me outside in
And the wind has blown
Me halfway across the world
Across the world

Why was I born
In an age of distrust
I'd offer some change
For a photograph
It will always be the same
You will always be the same

Until I show desire for revenge
My heart never once went astray
As long as I have to die in the attempt
Then there'll be no reason
To live forever

(Dream Theater, To Live Forever)



Era necessário dizer algo sobre esse filme, ainda que não fossem de minha autoria. O que nós realmente queremos? O mito da vida eterna, do amor que supera a vida (por æons)...no fundo, o amor por nós mesmo e nosso apego pela vida.

A eterna pergunta lançada no vazio da noite





por que existo?





Tudo o que fazemos para ocupar nossa (curta) estada nessa hospedaria na curva no universo, todas as tentativas de deixar uma marca para a posteridade (Kilroy esteve aqui), todas as cerimônias, todoas as glórias, todo o dinheiro...nada disso realmente importa, não quando comparado ao ato de criar. Deus é tudo aquilo que nos impele a continuar, seja uma pessoa, uma idéia, um conceito, uma ideologia, uma causa, uma coisa. Não existem ateus.

Amar (mesmo quando não somos correspondidos) é criar.

16.4.07

if I seem superhuman I have been misunderstood

Fazem 9 minutos que um novo dia começou e eu estou comendo miojo.

A ausência é capaz de causar sérias mudanças em nós mesmos. Você nunca sente tanto falta de cigarro quanto quando, no meio da noite, se dá conta que os seus acabaram e ninguém na mesa têm (Porque eu não comprei outro maço?); nunca sente falta do seu melhor amigo até vê-lo embarcando num avião para viver muitos meses longe de você (Porque eu não fui visitá-lo mais vezes?); nunca sente falta do amor até conhecê-lo de verdade (Onde você esteve todo esse tempo?).

Somos seres egoístas, ninguém disputa esse fato. Só sentimos falta quando já não há nada a ser feito e aí nos culpamos (ou aos outros, dependendo da moral de cada um) pelo que poderia ter sido. Nos arrastamos na mesmice por medo do diferente e depois, quando o diferente nos rejeita (por qualquer razão) nos sentimos feridos e humilhados, invariavelmente julgando injusto o acontecido.

Temos uma natureza macunaímica. Quando digo isso, não me refiro ao tão propagado (e infundado) mito da preguiça brasileira. Ou melhor, não como tradicionalmente se refere à tal mito. O brasileiro não é preguiçoso nem vagabundo, exceto quando se trata de cuidar da sua própria vida. Quantas vezes não vemos pessoas serem tradadas de maneira mais desrespeitosa que um animal e não fazemos nada? Ora, na maioria das vezes não fazemos nada nem quando nós mesmos somos tratados assim! E, no entanto, assim que termina o dia e saímos da casa-grande, nos encontramos na senzala e comentamos um com os outros: "nós não devíamos viver assim, isso é indigno". Mesmo assim, quando raia o novo dia, lá estamos nós no batente sorrindo p'ro sinhôzinho. E não bastasse tal atitude com relação ao nosso trabalho, à nossa vida pública, à nossa cidadania, agimos assim com relação aos nossos afetos.

A pessoa a quem eu amo vive longe de mim. Diversos fatores tornam, no atual momento, impossível uma vida a dois como normalmente deveria ser. E tudo o que vejo à minha volta faz a luz no fim do túnel cada vez mais parecer uma miragem.

18 minutos depois, ainda não digeri meu miojo.